Há
muitos e muitos anos existiu uma viúva que tinha um filho chamado João.
João
e a mãe eram muito pobres e, para se manterem, contavam apenas com uma vaca,
cujo leite vendiam na cidade.
Um
dia, porém, a vaca parou subitamente de dar leite, e a pobre mulher, tendo
perdido assim a fonte de seu sustento, ficou preocupada e sem saber o que
fazer.
João,
de sua parte, começou a procurar um emprego, com o qual pudesse ajudar a mãe.
Mas os dias foram passando sem que ele arranjasse coisa alguma para fazer.
Assim, a única solução que encontraram foi vender a vaca, pois o dinheiro
daria pelo menos para viverem por algum tempo.
João
logo se ofereceu para ir vender o animal na cidade, mas a mãe, achando que ele
não saberia negociar, a princípio não consentiu. Entretanto, porque ela
própria poderia sair de casa naquele dia, não teve outro remédio senão
concordar com a idéia. Amarrou então uma corda no pescoço da vaca, para que
João não a perdesse e, depois de dar muitos conselhos ao filho, deixou-o
partir.
E lá
se foi João, com destino à cidade.
Quando
estava no meio do caminho, encontrou um vendedor ambulante que o cumprimentou
muito simpático e perguntou-lhe aonde estava indo com a vaca.
Assim
que João contou que estava indo vendê-la na cidade, o homem tirou do bolso um
punhado de feijões, muito bonitos e de cores e formatos variados, e mostrou-os
ao menino, dizendo que eles eram encantados.
João
ficou deslumbrado com a beleza dos grãos e, ao ouvir as palavras do vendedor,
seus olhos brilharam de alegria. Morrendo de vontade de possuir os feijões
encantados, perguntou ao homem se ele não gostaria de trocá-los pela vaca.
O
vendedor concordou prontamente com a troca. E, horas depois, João chegava em
casa muito satisfeito, achando que havia feito um excelente negócio.
A
mãe o recebeu muito contente, mas, quando o menino lhe mostrou o que havia
conseguido em troca do animal, ficou furiosa e disse:
—
Como, meu filho?! Você teve coragem
de
trocar a única coisa que possuíamos por
uma
porcaria duns grãos de feijão?
E,
quanto mais pensava na situação difícil em que ela e o filho estavam agora,
mais nervosa ficava. Até que, num acesso de raiva, jogou os feijões pela
janela, gritando:
—
Veja, seu tolo! Veja para o que ser
vem
seus grãos encantados: para jogar fora!
O
pobre menino, desconsolado, ficou olhando para a mãe sem nada conseguir dizer. E, como castigo, naquela
noite foi mandado para a cama sem jantar.
Na
manhã seguinte, ao acordar, João ainda estava muito triste e não conseguia
esquecer o acontecimento do dia anterior. Estava deitado, tentando encontrar
um jeito de remediar o que havia feito, quando notou que havia alguma coisa
impedindo o sol de entrar pela janela. Levantou-se para espiar o que era e,
espantado, descobriu que os grãos de feijão não só haviam brotado durante a
noite, como também haviam crescido assustadoramente, transformando-se numa
planta enorme, que subia até o céu.
Admirado
e feliz, o menino correu até o quintal e, sem pensar duas vezes, começou a
subir pelo pé de feijão. Subiu, subiu e subiu; atravessou muitas camadas de
nuvens macias como flocos de algodão e, por fim, descobriu que a planta
terminava num estranho país, onde tudo parecia deserto.
Como
queria saber onde estava, João resolveu andar para ver se encontrava alguém por
ali. Mas o lugar parecia completamente desabitado, pois, mesmo andando horas
em seguida, não viu ninguém pelo caminho. Porém, quando já estava escurecendo
e o seu estômago até doía de fome, João avistou um enorme castelo para onde se
dirigiu. Encontrou na porta uma mulher que pareceu muito assustada em vê-lo
ali.
— O
que você está fazendo aqui, menino? — disse ela. — Não sabe que esse castelo
pertence ao meu marido, um gigante muito mau, devorador de carne humana?
Ao
ouvir isso, João sentiu as pernas bambearem de medo. Mas, como a mulher lhe
dissesse que o gigante estava fora, caçando, e também como a fome e o cansaço
não o deixassem andar mais, pediu a ela que o abrigasse e escondesse até o
dia seguinte.
Embora
fosse casada com um homem tão mau, a esposa do gigante era uma pessoa muito
bondosa. Assim, ficou com muita pena do menino e levou-o para dentro do
castelo, onde serviu-lhe uma mesa coberta de coisas deliciosas. João, que estava
morto de fome, comeu tudo com tanto apetite e gosto que logo se esqueceu do
perigo que estava correndo. De repente, porém, ouviu-se um grande barulho na
porta, seguido de passos tão pesados que o castelo inteiro estremeceu.
—
Oh, meu Deus! — disse a mulher, tremendo como vara verde. — É o gigante,
menino ! Ele não pode encontrar você aqui senão vai devorar você e a mim
também!
Ao
vê-la tão assustada, João ficou paralisado de medo. Mas a mulher o puxou
rapidamente pela mão, e mal teve tempo de escondê-lo dentro do forno, antes
que o gigante entrasse na cozinha, gritando com sua voz de trovão:
—
Mulher! Mulher, estou sentindo cheiro de carne humana!
Um,
dois e três,
diga-me
de uma vez:
onde
está esse abelhudo?
Vou
comê-lo com ossos e tudo!
Mais
que depressa, a mulher explicou que o cheiro de carne era dos franguinhos que
ela havia matado para o jantar.
João,
que estava espiando por uma frestinha do forno, ficou apavorado só de pensar no
que aconteceria se o gigante o encontrasse. Mas a bondosa mulher, que sabia que
o marido era muito comilão, apressou-se em servir a comida, antes que ele
começasse a procurar por todos os cantos da casa até encontrar o pobre
menino.
O
gigante sentou-se então à mesa e, para começar a refeição, engoliu uma dúzia de
frangos assados, com ossos e tudo. Com os olhos arregalados, João assistiu à
mulher trazendo para a mesa pratos e mais pratos, que o gigante engolia
rapidamente, sem nunca ficar satisfeito.
Quando
acabou finalmente sua refeição, o comilão gritou para a mulher:
— Traga-me o dinheiro!
— Está bem! — respondeu ela, saindo da
cozinha.
E,
logo em seguida, voltava com dois sacos cheios de moedas de ouro. Depois de
ordenar que a mulher fosse dormir, o gigante colocou os sacos de moedas sobre a
mesa e começou a contá-las, enquanto esperava o sono chegar.
Quando
se cansou desse divertimento, guardou as moedas de novo nos sacos e depois
colocou-os no chão, perto de si. Só que, por precaução, amarrou ao pé da mesa
um cão de guarda, e depois recostou-se na cadeira e pôs-se a dormir.
João,
que a tudo assistia de seu esconderijo, esperou que o gigante estivesse
dormindo profundamente e, quando viu que ele estava roncando como um trovão,
saiu de mansinho do forno para roubar o dinheiro. Entretanto, assim que pôs as
mãos sobre os sacos de moedas, o cão de guarda começou a latir feito louco e o
pobre menino, apavorado, julgou-se completamente perdido.
Acontece
que o gigante tinha um sono pesado demais e os latidos fizeram apenas com que
ele se mexesse na cadeira, sem conseguir acordá-lo.
Mais
sossegado, o menino subiu na mesa da cozinha e, depois de pegar um pedação de
carne, jogou-o ao cão, que abanou o rabo e ficou em silêncio, deliciando-se com
o petisco.
João
pôde assim pegar o dinheiro e fugir dali. Correu sem parar até alcançar o pé de
feijão, descendo habilmente até chegar ao quintal de casa.
Em
seguida, chamou pela mãe e, depois de contar-lhe toda a aventura, entregou-lhe
os dois sacos de moedas.
Corri
o dinheiro roubado do gigante, João e a mãe passaram a levar uma vida de rei.
Nada mais faltava na casa e eles não precisavam mais temer a fome e a
necessidade.
Mas
o tempo foi passando e os sacos de moedas começaram a ficar vazios. E João
pensou, então, em voltar ao castelo do gigante, para se apoderar de mais
riquezas.
Contou
sua vontade à mãe e ela, com medo de que alguma coisa pudesse acontecer-lhe,
proibiu-o de ir.
— Já
pensou se o gigante agarrar você? — disse ela. — E a mulher dele? Ela certamente o reconhecerá e poderá
entregá-lo ao marido!
Percebendo
que a mãe não ia mesmo permitir, João fingiu aceitar o que ela dizia. Mas, na
primeira chance que teve, saiu escondido e subiu novamente pelo pé de feijão,
desta vez muito bem disfarçado para que a mulher do gigante não o reconhecesse.
Chegou
assim mais uma vez ao estranho país e, depois de caminhar até o anoitecer,
avistou o castelo do gigante, na porta do qual encontrou novamente a boa
mulher.
—
Menino! — disse ela, sem reconhecer João. — O que você faz aqui? Não sabe que
esse castelo é do meu marido, um gigante muito mau, devorador de carne humana?
João
fingiu-se muito assustado, e pediu à mulher que o escondesse até o dia
seguinte, dizendo que não conseguiria encontrar o caminho de casa no escuro.
—
Ah, não! — respondeu ela. — De jeito nenhum! Da última vez que fiz isso me
arrependi amargamente! Já dei abrigo a
um menino como você e o mal-agradecido fugiu, levando dois sacos de moedas de
ouro do meu marido. Por causa disso, quase fui devorada no lugar do
malandrinho! E o gigante, desde então, tem estado com um humor terrível, que eu
sou obrigada a suportar!
Mas
João sabia ser convincente e pediu tantas vezes que a boa mulher acabou
concordando em escondê-lo. Assim, levou-o para dentro do castelo e deu-lhe de
comer e de beber. E, novamente, mal teve tempo de esconder João, desta vez
dentro de um quartinho de despejo, e o gigante já chegava, com seu andar tão
pesado que fazia o castelo estremecer. Dali a pouco, ele já estava na
cozinha, gritando com voz de trovão:
—
Um, dois e três.
Cheiro
de gente outra vez! Onde está esse abelhudo? Vou comê-lo com ossos e tudo!
Enquanto
dizia isso, o gigante procurava por todos os cantos da casa.
João,
que a tudo assistia pela fechadura da porta, ficou morrendo de medo de ser
encontrado. Mas a bondosa mulher mais uma vez convenceu o marido de que não
havia ninguém na casa e, enchendo a mesa de comida, conseguiu distraí-lo.
Novamente
o gigante comeu até se fartar e depois disse à mulher:
—
Mulher, traga-me a galinha!
Ela,
como da outra vez, obedeceu às ordens e saiu da cozinha, para voltar logo
depois, trazendo uma galinha viva. O gigante colocou a galinha sobre a mesa e,
assim que a mulher se retirou, ordenou:
—
Bote!
E
João viu, espantado, a galinha botar um ovo que não era nem branco e nem igual
aos das galinhas comuns, e sim de ouro, ouro puro e maciço!
—
Bote outro! — ordenou o gigante.
E a
galinha obedeceu. Assim aconteceu sucessivamente, até que a mesa da cozinha
ficou repleta de ovos de ouro, bonitos e reluzentes.
De
repente, o gigante se cansou de mandar a galinha botar os ovos e,
debruçando-se sobre a mesa, caiu, logo em seguida, num sono profundo.
Quando
ouviu o gigante roncando outra vez como um trovão, João saiu em silêncio de seu
esconderijo. E, como desta vez não havia nem o cão de guarda para atrapalhar,
foi muito fácil agarrar a galinha e fugir correndo do castelo, até chegar ao
pé de feijão.
Logo
que entrou em casa, João chamou a mãe e, depois de lhe contar a sua aventura,
entregou-lhe a galinha dos ovos de ouro.
Daquele
dia em diante, nada mais lhes faltou, pois, sempre que precisavam de alguma
coisa, bastava ordenar à galinha que botasse um ovo, e ela obedecia
prontamente.
Mesmo
sendo agora rico e feliz, João voltou a ter vontade de subir outra vez ao castelo
do gigante. Mas, sempre que falava nisso, a mãe o repreendia tão severamente,
que o menino acabava adiando a viagem, sem entretanto desistir da idéia.
Passaram-se
assim três anos, no final dos quais João tomou uma decisão: ia subir de novo,
custasse o que custasse, e não contaria nada à mãe.
Assim,
esperou pacientemente que chegasse o verão, quando os dias são mais longos e,
depois de se disfarçar muito bem, subiu pelo pé de feijão antes que o sol
nascesse, para que a mãe não o visse.
Novamente
chegou ao castelo numa hora em que o gigante não estava, e mais uma vez não foi
reconhecido pela mulher, que voltou a falar-lhe dos perigos que corria estando
ali. Só que, desta vez, foi muito mais difícil convencê-la a recolher um
estranho em seu castelo, pois o gigante, depois do último roubo, estava com um
humor insuportável e cada dia se tornava mais malvado.
João,
porém, sabia que a mulher era muito bondosa e continuou insistindo até que
conseguiu convencê-la. Foi então acolhido, e de novo lhe foi servida uma
refeição deliciosa.
Mas
nesse dia o gigante chegou tão repentinamente que a mulher só teve tempo de
colocar João dentro de um caldeirão, antes que o marido entrasse na cozinha
gritando:
—
Mulher! Sinto cheiro de carne humana!
Um,
dois e três,
diga-me
de uma vez:
onde
está o abelhudo?
Vou
comê-lo com ossos e tudo!
E
estava tão furioso e desconfiado, que começou a procurar por todos os cantos,
sem nem ouvir a esposa chamando-o para o jantar.
Procurou,
procurou e procurou até que, finalmente, chegou bem perto do caldeirão onde
João estava escondido. Ao ouvir aqueles passos que faziam o chão tremer e
aquela voz de trovão gritando furiosamente, o pobre menino achou que estava
mesmo perdido. Por sorte, entretanto, o gigante sentiu uma fome repentina e
ficou com preguiça de levantar a tampa do caldeirão. Por isso, desistiu de
procurar e gritou:
—
Mulher! Quero jantar!
Dentro
de seu esconderijo, João suspirou aliviado. E ali ficou bem quietinho,
esperando que o comilão fizesse sua interminável refeição.
Quando,
afinal, estava satisfeito, o gigante gritou para a mulher:
—
Traga-me a harpa de ouro!
E
ela, como sempre fazia, obedeceu-lhe prontamente. O gigante esperou que ela se
retirasse para dormir, depois colocou o instrumento sobre a mesa e ordenou:
—
Toque!
No
mesmo instante, a harpa de ouro começou a tocar sozinha uma melodia doce e
suave, que deixou João maravilhado e que embalou os sonhos do malvado gigante.
Assim, o menino esperou até que ele estivesse roncando bem alto, saiu em
silêncio do caldeirão e correu na direção do valioso instrumento.
Acontece
que a harpa era encantada e, ao sentir que mãos estranhas a tocavam, começou a
gritar com uma voz fininha:
— Socorro! Socooorro!
E o
gigante, ou porque não estivesse dormindo ainda, ou porque gostasse muito da
harpa, acabou acordando. Ao ver que estava sendo roubado, levantou-se da
cadeira, gritando, furioso:
—
Ah, seu maldito! Desta vez você me paga! Quando eu o pegar, vou engoli-lo vivo,
com ossos e tudo!
Disse
isso e veio direto em cima do pobre João, que, muito assustado, começou a
correr até não poder mais. A harpa de ouro, por sua vez, continuava gritando,
com sua vozinha fina:
—
Socorro, meu senhor! Estão me roubando !
E
João, ao ouvi-la falar, corria mais ainda, achando que o gigante o estava
alcançando.
De
repente, no entanto, João percebeu que havia já alguns minutos não ouvia mais
os urros e o barulho dos passos de seu perseguidor. Intrigado, virou-se para
trás e descobriu uma coisa que o deixou muito feliz: o gigante, embora fosse
grande e forte, já estava velho e não conseguia correr muito.
Mesmo
assim, ainda havia um longo caminho para chegar ao pé de feijão, e por isso o
menino agarrou de novo a harpa, que não parava de gritar por socorro, e
continuou a correr.
Horas
depois, alcançou de novo seu pé de feijão e começou a descer. Quando estava já
no meio da haste da imensa planta, porém, João olhou para cima e viu que o
gigante, por ser muito pesado, descia numa rapidez incrível. Assim, logo que
avistou o quintal de casa, o menino começou a gritar pela mãe:
—
Mamãe, mamãe! Traga-me um machado, depressa!
Quando
João pôs os pés no chão, a mãe já se preparava para dar os primeiros golpes na
planta. Mas a viúva, ao olhar para cima e ver o tamanho do gigante, ficou
paralisada de medo.
João
estava muito cansado, mas conseguiu reunir todas as suas forças e,
apossando-se do machado, golpeou várias vezes o pé de feijão. Tendo sido
cortada a planta, o gigante despencou lá do alto, caindo ao chão com um grande
estrondo. Era tão pesado que | seu corpo, ao cair, fez uma cratera enorme, que
demorou muitos anos para fechar.
Livre
do perigo que o ameaçava, João nbraçou a mãe alegremente. E, desde aquele dia,
os dois passaram a viver tranqüilos.
Tempos
depois, quando se tornou um homem forte e bonito, João se casou com uma
princesa, com quem viveu feliz por muitos e muitos anos.
Quanto
ao pé de feijão, depois de cortado, secou completamente e, como não havia mais
sementes, nunca mais nasceu outro igual.
Contos de Grimm
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigada por deixar seu recadinho!